Comparado há uma hora mais cedo, a entrada estava pacífica: carros chegavam com cada vez menos frequência, jornalistas já não tinham tanto conteúdo a registrar, os manobristas e atendentes conversavam entre si. Tudo perfeitamente calmo e parado, tanto que nem o vento mais soprava, e as nuvens pareciam estáticas em meio a abóbada estrelada.
Entretanto, como os homens do mar sabem, a calmaria não é um bom presságio, ela é um alerta para ancorarem seus barcos e procurarem abrigo - sempre é mais calmo antes das piores tormentas.
Naquela noite, não seria muito diferente.
De repente um vento soprou, forte e gélido, deixando uma geada em seu encalço. As estrelas e a lua foram ocultadas por pesadas nuvens, formadas em um piscar de olhos. As luzes perderam sua intensidade, como se consumidas pela escuridão.
"O que estava acontecendo?" As pessoas se perguntavam, inquietas, olhando umas para as outras. Os fantasmas do ano que se passara subitamente estavam presentes, observando, esperando. O medo e a expectativa marcavam as expressões.
Então vieram os sinos, como as badaladas de um relógio. Uma luz azul quebrou a barreira das nuvens; as pessoas olharam, e o medo deu lugar a incredulidade, a fascinação.
As nuvens se dissiparam e as luzes voltaram, banhando a imensa carruagem de madeira negra, minuciosamente talhada com detalhes em prata e esmeralda, em luz. À sua frente vinham um cocheiro e seis criaturas que nenhum deles jamais vira igual: imensas asas, seis patas cada, crinas feita de uma pura luz azulada e chifres contorcidos. Cavalgavam o ar como se fosse o chão, e pousaram com a carruagem sem fazer barulho.
Estampado na porta dupla do transporte, estava um símbolo que muitos ouviram falar nos últimos meses- estrangeiros de um Império que crescia no além-mar, que ainda não haviam sido introduzidos à corte.
Os flashes começaram, antes mesmo das portas do veículo se abrirem.
Os representantes de Thyrmëinn estavam ali.
O interior da carruagem era finamente decorado em veludo negro, com cortinas prateadas adornando uma janela de vidro, feita de um modo que quem estivesse fora a veria como parte da porta, mas os passageiros enxergariam tudo.
Ao ver o grupo eufórico do lado de fora, as luzes daquelas máquinas tão inexplicáveis para si, Aristanae sentiu o terror invadir sua mente, seu corpo treme. Juntou as mãos e as apertou com força. As luvas ajudavam com o seu poder, mas ela conseguia senti-lo debaixo de sua pele, em cada canto de seu corpo, esperando, paciente, para atacar.
Eles disseram que naquele mundo, ele estaria sobre controle. E ela gostaria desesperadamente de acreditar nisso.
Deu mais uma olhada em seu vestido, e por mais que as criadas dissessem que ele era belíssimo e perfeitamente apropriado, sentia-se nua. Eram duas camadas de tecido fluido, uma cinza escuro e outra preta brilhosa, como uma noite estrelada, o de baixo mais opaco que o de cima, mas ainda um pouco transparente, sobre um forro da cor de sua pele. Um decote em V se abria em suas costas, permitindo ver a imaculada pele branca.
Mãos experientes haviam bordado o vestido com pedras de rubi, fios de prata, diamantes e outras pedras que desconhecia, em outros tons de cinza e vermelho, e o resultado era formidável: flores adornavam a barra, e delas subia uma macieira, com pássaros ao seu redor. O corpete imitava a barra e a saia, em menor escala, e as flores rodeavam sua cintura.
Entretanto, o que tornava o vestido único era a
magia embutida nele: se alguém o olhasse no momento certo, veria as folhas caindo, os pássaros voando ao longo da saia, as flores se movendo como se o vento soprasse. E nunca piscar de olhos tudo passara.
Usava brincos pequenos e delicados, flores de rubi em cachos pequenos e pouco cheios, o cabelo preso estava em um coque, com alguns fios solto e uma delicada coroa de flores rubras em sua cabeça.
Levantou os olhos para o seu acompanhante, Celthric, e por mais que não se sentisse preparada, que estivesse assustada, balançou a cabeça , um gesto silencioso de que estava pronta para enfrentarem quem estava lá fora e cumprirem seus deveres.